Fonte : Valor Econômico
No fim de dezembro, um carro de som trafegava devagar pelo novo píer de embarque de minério de ferro no terminal marítimo de Ponta da Madeira, da Vale, na Baía de São Marcos, em São Luís, no Maranhão. O veículo transmitia informações de segurança aos 2,5 mil trabalhadores envolvidos nas obras no local. Poucos dias depois, o navio Ore Belo Horizonte, pertencente à Vale, fez o primeiro teste operacional no píer IV, como é conhecida a nova estrutura para atracar navios em Ponta da Madeira. A embarcação carregou 800 toneladas de minério em cerca de dez minutos.
A previsão é de que o primeiro dos dois berços do píer IV seja entregue para operação em março. Essa ponte de concreto, com os berços de atração e os respectivos equipamentos para carregar os porões dos navios, forma o elo final de uma cadeia logística que vai receber até 2017 investimentos de US$ 15,5 bilhões da mineradora. O investimento é estratégico para suportar, no mesmo período, o crescimento previsto de cerca de 80% na capacidade de produção de minério de ferro da empresa no Norte do país.
É o maior projeto de mineração em curso no mundo e a logística acompanha essa expansão, disse Zenaldo Oliveira, diretor de operações logísticas da Vale. O projeto citado por Oliveira inclui a ampliação da Estrada de Ferro de Carajás (EFC), que sai de Carajás, no Pará, e se estende por 892 quilômetros até chegar a São Luís; a construção de novos pátios para estocagem e movimentação de minério de ferro no complexo industrial de Ponta da Madeira, onde chegam os trens carregados, e a construção do píer IV no terminal offshore.
A expansão da logística na região foi dividida em duas etapas. A primeira fase contempla o investimento de US$ 4,1 bilhões em obras para aumentar a capacidade da EFC, dos pátios e do porto, em São Luís. Esses recursos vão permitir à área de logística da Vale acompanhar um primeiro salto, da ordem de 40 milhões de toneladas por ano, na produção de minério de ferro em Carajás (no sul do Pará). Nessa etapa, o objetivo da Vale foi assegurar uma capacidade de escoamento de 150 milhões de toneladas de minério de ferro por ano no norte, a partir do segundo semestre de 2014.
Hoje, a capacidade de escoamento do sistema norte da Vale é de cerca de 130 milhões de toneladas por ano. O projeto de expansão, chamado de Capacitação Logística Norte (CLN150), está praticamente concluído na parte de porto, mas ainda tem serviços de ampliação a serem feitos na EFC. O início da operação deste projeto está previsto para março, quando o berço sul do píer IV começará a operar. Em uma segunda fase, haverá investimentos no berço norte.
A segunda fase da ampliação da capacidade logística norte da Vale está ligada ao projeto S11D, na Serra Sul de Carajás, que vai acrescentar 90 milhões de toneladas de minério de ferro por ano à produção da mineradora no Pará, a partir de 2017. Com este segundo projeto, a capacidade total de produção da Vale no norte deve chegar a 230 milhões de toneladas por ano daqui a quatro anos. Estão previstos investimentos de US$ 11,4 bilhões no CLN do S11D. Os dois projetos logísticos no sistema norte da Vale somam US$ 15,5 bilhões em investimentos. Na produção, na Serra Sul de Carajás, vão ser investidos mais US$ 8 bilhões.
Em recente entrevista ao Valor, o presidente da Vale, Murilo Ferreira, deixou claro que para tirar esses projetos do papel a empresa terá que apertar o cinto e cortar custos. A Vale também vem vendendo ativos que não fazem parte do negócio principal da empresa, como é o caso dos blocos exploratórios de petróleo e gás. Ferreira previu que só o projeto do S11D vai empregar, na fase de obras, 30 mil pessoas. É um número maior do que o utilizado, no pico das obras, em julho de 2011, na usina hidrelétrica de Santo Antônio, no rio Madeira, quando o contingente empregado atingiu 20 mil trabalhadores.
Quando entrar em operação, o novo projeto de mineração da Vale deverá criar três mil empregos diretos e seis mil indiretos, previu Ferreira. Hoje, entre obras da ferrovia e do porto, há 13.574 trabalhadores em canteiros de obras da Vale no sistema norte. E o pessoal empregado nas operações existentes, entre funcionários próprios e de terceiros na ferrovia e no porto na região norte, supera os dez mil postos de trabalho.
Humberto Freitas, diretor-executivo de logística, exploração mineral e tecnologia da Vale, disse que o projeto de Capacitação Logística Norte do S11D deverá ser submetido à aprovação do conselho de administração da Vale ainda este mês. Freitas afirmou que os US$ 11,4 bilhões a serem investidos em logística para escoar a produção de Serra Sul consideram US$ 1,26 bilhão em material rodante, incluindo a compra de vagões e locomotivas.
Na EFC, devem ser investidos US$ 7,6 bilhões. Serão construídos quase 50 viadutos e grande parte dos 56 pátios para manobra e estacionamento dos trens - comboios de 3,5 quilômetros e 336 vagões - serão ampliados. No porto, em Ponta da Madeira, os investimentos alcançam US$ 2,5 bilhões. Esses investimentos se somam aos realizados na primeira fase do projeto logístico.
O terminal marítimo conta com dois píeres em operação para o embarque de minério e a Vale arrenda ainda um berço, cujo contrato vence em 2013, no porto vizinho do Itaqui. Freitas nega que, com o píer IV, Ponta da Madeira esteja chegando ao limite de capacidade como porto: Não posso dizer isso [que a capacidade do terminal com o novo píer tenha chegado ao limite]. Um novo píer [de número V] está demandando estudos técnicos profundos, afirmou. As variações de maré na Baía de São Marcos são, porém, um desafio para a construção de mais um píer no local.
Outra possibilidade de expansão portuária para a Vale no norte do país, a médio prazo, é a construção do porto de Espadarte, no Pará. É uma possibilidade que está em estudo preliminar, na fase de análise ambiental, disse Freitas. O executivo citou o fato de a Vale ter conseguido mais de 100 licenças ambientais em 2012, o que permite dar continuidade às operações e garante as expansões. Os projetos logísticos do sistema norte da Vale obtiveram licenças prévia e de instalação, disse Freitas. Segundo ele, o ramal ferroviário que vai ligar a EFC à Serra Sul (ver matéria nesta página) conta com licença prévia e tem expectativa de receber a licença de instalação em abril.
Na área do complexo industrial de Ponta da Madeira, estão sendo criadas novas áreas de pátios para armazenar e movimentar o minério de ferro adicional que chegará pelos trens desde Carajás para ser embarcado nos navios. Dentro do complexo da Vale, em São Luís, vão surgir duas novas áreas de pátios: uma do CLN 150, com 250 hectares, e outra, com 500 hectares, para o CLN S11D. Esses pátios somam 750 hectares, área 83% maior do que o bairro de Copacabana, na zona sul do Rio, que tem 410 hectares.
A Vale informou que as obras de terraplenagem dos pátios do S11D devem começar em junho. Os projetos logísticos da Vale no norte possuem obras civis que atendem a ambos os empreendimentos, como é o caso das caixas dos novos viradores de vagão (máquinas que descarregam de forma automatizada o minério dos vagões). Nos pátios em operação, a capacidade de recuperação (movimentação) de minério é de 56 mil toneladas por hora.
Com o CLN 150, serão acrescidos 16 mil toneladas por hora de capacidade nos pátios, elevando a capacidade total para 72 mil toneladas por hora, a partir de 2014. E com o S11D serão acrescidos mais 16 mil toneladas por hora de capacidade de pátio, chegando a 88 mil toneladas por hora em 2017. No porto, a capacidade de embarque de minério nos píeres um e três de Ponta da Madeira chega, no total, a 40 mil toneladas por hora. Com o píer IV, em suas duas fases (berços sul e norte), serão acrescentadas 32 mil toneladas, disse José Roberto Diniz, líder-executivo do Programa Capacitação Logística Norte para as obras no porto. Portanto, a capacidade de embarque no terminal de Ponta da Madeira vai chegar a 72 mil toneladas por hora a partir de 2017. A primeira fase dessa expansão no porto começa em março com o início da operação do píer IV.
Mineradora vai cercar 101 quilômetros da Ferrovia Carajás
A Vale tem planos de cercar os 101 quilômetros do ramal ferroviário que vai construir para ligar a Estrada de Ferro de Carajás (EFC) ao projeto S11D, nova área de produção de minério de ferro da empresa, na Serra Sul de Carajás. O cercamento da faixa de domínio da ferrovia deve se estender também a outros trechos dos 892 quilômetros da EFC, alvo constante de invasões que paralisam o transporte do minério escoado para exportação pela região norte do país.
Zenaldo Oliveira, diretor de operações logísticas da Vale, confirmou que o ramal ligando a EFC ao S11D será cercado e que a empresa estuda ainda cercar trechos existentes da ferrovia. Nos trechos operacionais, a Vale deverá negociar o cercamento com prefeituras e associações locais. Mas não é só cercar. Também estamos fazendo viadutos e trabalhamos questões sociais com governo e comunidades, disse Oliveira.
Serão construídos 45 viadutos na EFC dentro da expansão da ferrovia que terá a capacidade praticamente duplicada para atender ao crescimento da produção de minério de ferro de Carajás com o S11D. A construção dos viadutos será importante para dar mais fluidez ao tráfego em comunidades da área de influência da EFC. Em 2012, houve uma invasão de indígenas que paralisou a EFC por alguns dias. Nos últimos anos, a ferrovia tem sofrido invasões e protestos feitos por grupos que, muitas vezes, não têm demandas diretas em relação à mineradora, mas buscam pressionar o governo em relação a outros temas.
Em média, chegam 12 trens por dia carregados com minério de ferro no complexo industrial de Ponta da Madeira, em São Luís, no Maranhão, por onde o produto é embarcado em navios para o mercado externo. Esse número de trens vai dobrar com a produção do S11D. O crescimento na demanda também leva a Vale a buscar inovações para melhorar a produtividade e reduzir custos operacionais da malha.
Oliveira citou, por exemplo, estudos para operar locomotivas com gás natural. A Vale testou o uso de biodiesel e agora a ideia é ter locomotivas rodando a gás natural. O projeto está em fase inicial, mas há protótipo a gás operando na Estrada de Ferro Vitória a Minas (EFVM), que escoa a produção de minério de ferro de Minas Gerais exportada via Vitória, no Espírito Santo.
O executivo citou outro estudo que consiste em utilizar dormentes de plástico, que estão sendo testados em trecho da EFC. Precisamos fazer uma observação [do material] ao longo de anos para ver os resultados, disse Oliveira. A Vale vem substituindo os antigos dormentes de madeira por peças de concreto e de aço na EFC e na EFVM. Outra inovação é o uso de uma máquina que renova a linha férrea substituindo brita, dormentes e trilhos de forma automatizada. A máquina é capaz de trocar 1,5 quilômetro de linha em 12 horas.
Everardus Pouw, gerente-geral de operações da EFC, mencionou outra inovação, o uso do freio elétrico-pneumático, que melhora a frenagem dos trens. Em Carajás, a Vale incorporou, há alguns anos, comboios com 336 vagões para o transporte de minério. É o maior trem do mundo em operação regular, disse Pouw. O comboio se estende por 3,5 quilômetros. Com o freio elétrico-pneumático, a composição freia ao mesmo tempo e evitam-se choques, aumentando a vida útil dos vagões. Hoje o sistema de freio da composição funciona a ar, o que resulta em maiores choques entre os vagões.
A Vale também incorporou um sistema de engate de locomotivas em movimento para auxiliar na tração em trecho de subida da EFC, entre Marabá (PA) e Açailândia (MA). O mecanismo é conhecido como helper dinâmico e está há três anos em operação. Antes era preciso parar o trem e engatar duas locomotivas extras que ajudam a empurrar o comboio. Com o novo sistema, a locomotiva persegue o trem em movimento e, sem o auxílio do maquinista, a máquina se conecta em movimento ao último vagão reforçando a tração do comboio. Ganhamos 900 litros por trem e economizamos uma hora no percurso, o que gera mais produtividade, disse Pouw.
Programa tenta atrair fornecedor para região
Em Bacabeira, na grande São Luís, a Alusa Engenharia e a americana Rocla investiram R$ 45 milhões para montar uma fábrica com capacidade de produzir 400 mil dormentes de concreto por ano. Esses dormentes são usados nas ferrovias da Vale. A fábrica tem previsão de duplicar a capacidade com um investimento adicional de cerca de R$ 25 milhões, disse Guilherme Godoy, presidente da Cavan Rocbra, sociedade entre a Alusa e a Rocla.
A expansão da unidade de produção de dormentes em Bacabeira depende, porém, de uma sinalização da Vale em relação à demanda futura de dormentes. A Cavan Rocbra se instalou no Maranhão a partir de um trabalho de atração de fornecedores feito pela Vale. A mineradora tem interesse em atrair para a região empresas que fornecem bens e serviços para os seus projetos de expansão no Norte do país.
Godoy disse que a Cavan Rocbra tem contrato para fornecer 740 mil dormentes para a Vale com uma opção que pode levar a encomenda para 3,25 milhões de peças. Se a opção for confirmada, haverá necessidade de expandir a capacidade da fábrica, disse Godoy, que também é vice-presidente da Alusa Engenharia.
O executivo afirmou, no entanto, que a mão de obra tem sido um problema para as empresas que se instalam no Maranhão. Ele disse que é preciso investir em treinamento, mas diversos projetos de investimento em curso no Estado têm provocado alta rotatividade de trabalhadores. Estamos trabalhando em um plano de incentivo de retenção de mão de obra, afirmou. A ideia da Cavan Rocbra é oferecer prêmios que estimulem a permanência dos funcionários.
A Vale informou que mais de 85% dos trabalhadores empregados nos canteiros de obra da empresa na região, entre projetos de ferrovia e porto, incluem mão de obra local. José Roberto Diniz, líder-executivo do Programa Capacitação Logística Norte da Vale para as obras de porto, disse que a empresa fez um programa de treinamento em diversos municípios para funções como pedreiro, carpinteiro e eletricista. É um treinamento que transcedente a implantação do projeto [da Vale], disse. Por esse conceito, parte da mão de obra qualificada pela Vale para os projetos da empresa poderá ser aproveitada, no futuro, para empreendimentos de outras companhias.
Augusto Cesar Maia Araujo Junior, secretário-adjunto da Secretaria do Desenvolvimento, Indústria e Comércio do Maranhão, reconheceu que a qualificação da mão de obra é um desafio, mas afirmou: Não temos nos omitido. O governo do Estado tem tentando minimizar o problema [da mão de obra] por meio de cursos em parceria com universidades e institutos técnicos. É interesse do Estado que o emprego fique aqui [no Maranhão].
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